domingo, 26 de junho de 2011


João Mattar fala sobre as características e os desafios da EAD no Brasil

por lucas

Pesquisador especializado em tecnologia da educação e um dos principais nomes da Educação a Distância (EaD) no país, João Mattar, colaborador do Portal Educação, esteve na empresa para conversar com os diretores sobre novos métodos de trabalho e novos conceitos ligados a EaD.

Não deixamos a oportunidade passar e fizemos uma breve entrevista com o especialista, abordando questões que interessam a qualquer pessoa que já pensou, pensa, ou pensará em fazer um curso à distância. Ele também fala sobre desafios na educação presencial. Vale a pena conferir e conhecer melhor o cenário da EaD no país.

Como está a confiança das pessoas em relação à educação a distância?

Tem melhorado ano a ano. O Governo Federal tem investido na formação dos professores a distância. Hoje nós temos a Universidade Aberta do Brasil (UAB), que já garante uma legitimidade, por ser o governo apoiando. Tem muita empresa de fora oferecendo cursos e a gente vê que o movimento é no mundo todo, e não só no Brasil. Além disso, uma coisa importante é que toda universidade pode oferecer 20% das disciplinas à distância. No começo, pouquíssimas faziam isso, e hoje está generalizado. Todo mundo que vai fazer faculdade presencial provavelmente terá alguns cursos à distância. Isso tudo vai aumentando a confiança das pessoas.

Tem aumentado a exigência para profissionais que estão entrando no setor de EaD?

Isso é um problema ainda, na verdade é um dos gargalos da história. Nós temos muito professor atuando em EaD sem formação adequada. No começo, não existia ninguém formado em educação a distância no Brasil. Começou com alguns pioneiros, que fizeram o curso fora do país. Aí entra o trabalho da Universidade Aberta do Brasil (UAB), que é usar a educação a distância para formar professores que, a princípio, são presenciais. Usa-se a educação a distância porque, pela educação presencial, não conseguiríamos formar o número de professores necessários nas salas de aula. A formação de professores de educação a distância é um problema ainda. O governo não faz isso bem. Algumas instituições privadas ou públicas oferecem alguns cursos, mas é pouco ainda, não temos tradição. Precisamos de mão de obra para ser reconhecida como referência de autoridades.

E o reconhecimento para profissionais formados por EaD, como está?

O Ministério da Educação (MEC) não permite que o diploma venha escrito “educação a distância”. Então, a princípio, nem sei como é feita essa mensuração porque, se a pessoa está com diploma e ninguém pergunta nada, ela é formada e pronto. Não se pode dizer que ela é formada em EaD. Sei que alguns Conselhos profissionais não aceitam o profissional formado em EaD. Mas as estatísticas mostram que tem diminuído muito a resistência. Até porque muita gente que faz curso presencial faz disciplinas a distância, e muita gente que faz cursos a distância tem encontros presenciais. Então a tendência é que não exista mais uma separação tão clara entre presencial e a distância. Se a pessoa teve uma formação presencial ou a distância, isso não vai fazer muita diferença. O mercado não vai medir isso.

Há um novo perfil de aluno de EaD surgindo?

A gente costuma dizer que sim, que o aluno tem que ser mais autônomo, mais auto-organizado, pois não tem um professor para cobrar, aula para ir. Mas isso não significa que o aluno não pode se adaptar. Na verdade, as pessoas se adaptam com facilidade a essas características exigidas, se elas são treinadas. Muitos cursos à distância, e esta é a pratica ideal, transformam a pessoa que está entrando em um aluno a distância antes e, depois disso, ele começa a fazer matérias. Preparação, desenvolver autodisciplina, acho que tudo pode ser desenvolvido. Levando isso em consideração, pode-se dizer que o perfil do aluno que sai é diferente, porque ele foi preparado para isso.

Vamos falar um pouco de novas tecnologias. Elas estão ganhando espaço na EaD?

Sim. Mas há um modelo de EaD que defende que devemos usar pouca tecnologia, só o mínimo. Ainda tem gente que defende o minimalismo tecnológico, que faz EaD de muito boa qualidade por lista de e-mail. Muita gente adora, dá certo. O outro modelo já não, utiliza bastante tecnologia: fóruns, chats, ambientes virtuais de aprendizagem, videoconferência, móbile, dispositivos móveis, mundos tridimensionais. O que realmente faz falta, tanto na EaD quanto na educação presencial, é a aplicação da tecnologia educacional. Nós temos um grande desafio, que é treinar os professores para usarem essas tecnologias, tanto na educação a distância quanto na presencial.

A tecnologia acaba sendo mais presente na EaD do que na educação presencial? A EaD depende de tecnologia?

Sim. Mas ambos os sistemas necessitam de tecnologia. Algumas pessoas falam que na EaD, pela distância, é necessária a utilização de mais meios tecnológicos. Mas é só no Brasil que isso acontece. Fora do Brasil, a “education tecnology” é um campo de estudos riquíssimo e não tem distinções quanto ao ensino presencial e a distância. Na EaD, é natural a utilização da tecnologia. Mas na presencial é um desafio muito grande porque depende de modificações em uma cultura enraizada.

Quais os maiores desafios para a área de EaD?

Formação de profissionais para atuar em educação a distância. A maioria dos tutores não tem formação em EaD. Faltam cursos de pós-graduação, especialização, treinamento para os profissionais trabalharem com design instrucional.
E também tem o problema dos modelos. O modelo que impera no Brasil é o autoinstrucional, em que o aluno estuda sozinho e faz uma prova no final. Existem modelos que são opostos a esse, são modelos interativos. A gente caminhou para um modelo que dispensa a presença do professor. Eu acho isso um grande problema. Para cursos rápidos, sem problemas. Agora, numa graduação, numa pós-graduação isso não é aceitável. Existem modelos com interação e a gente não caminhou para isso no Brasil. Vai ser muito difícil reverter a situação, porque hábitos não se mudam rapidamente, e a gente caminhou para modelos em que se aposta muito pouco na figura do professor e se baseia na figura do aluno estudando sozinho. Eu tenho sido contrário a isso, tenho mostrado que tem um modelo de EaD que pode ter interação, que a pessoa pode participar. Você chama um pouco mais, exige, não deixa só ela ler, fazer atividade.
Eu acho que a questão da formação da mão de obra e os modelos são os dois maiores desafios. A questão da credibilidade tem sido enfrentada. A resistência em relação ao modelo autoinstrucional ainda é grande. E eu também sou contra esse modelo. Ele não funciona, é pouco efetivo, mas tem outros modelos que funcionam muito bem.

Quais as recomendações para alguém que quer fazer um curso a distância?

Primeiro ele decide a área. Depois, pesquisa. Por exemplo, graduação em Direito ou Medicina não existe a distância no Brasil. Depois, ele tem que pesquisar para ver qual o modelo; o fato de ser “a distância” não define a história. Hoje é tão misturado que é possível que o curso que ele queira fazer exija a presença em um pólo, provas presenciais.
Além disso, ele precisa pesquisar a credibilidade da instituição. O MEC tem uma lista de instituições credenciadas. A avaliação é difícil, mas ele pode ler, procurar se informar, perguntar para as pessoas. Se a pessoa se decepciona com a presencial, ela muda de universidade. Se ela se decepciona com a EaD, ela acha que não se adapta ao modelo e desiste. Então ele tem que perguntar para pessoas que fizeram na área que ele fez.
Hoje, boas universidades presenciais montaram bons cursos a distância. Uma boa instituição presencial não vai se arriscar e fazer um trabalho ruim a distância porque ele vai acabar com a credibilidade que ele tinha no presencial. E se a pessoa tem disponibilidade, tempo e dinheiro para pagar um curso presencial, vale a pena, porque ele será apresentando aos dois modelos. Mas se é mais adequado para ela fazer a distância, basta pesquisar e se lançar na experiência.

Fonte: http://www.portaleducacao.com.br/blog/index.php/tag/ead/